As indústrias químicas, no Brasil, sejam de produção contínua ou por batelada, têm como um dos objetivos a implementação de ações para otimização dos diferentes consumos energéticos, particularmente o relacionado com a energia elétrica. Artigo elaborado por Obdulio Fanti, engenheiro químico e diretor do Departamento de Desenvolvimento Sustentável (DDS) da Fiesp, em conjunto com os pesquisadores Gabriele Comodi e Mosè Rossi, da Marche Polytechnic University (UNIVPM), da Itália; e Sérgio Pacca, da Universidade de São Paulo tem como foco ações de sustentabilidade, em particular as relacionadas à implementação de tecnologias de produção mais limpas na indústria química de baixo carbono. O tema está alinhado com as diretrizes ambientais do Programa Atuação Responsável no Brasil ou do Responsible Care Program de sustentabilidade da indústria química mundial.
Intitulado “Energy efficiency in urea processes by recovering the excess pressure through hydraulic recovery turbine (HPRTs)”, o trabalho está sendo publicado no mês de agosto no “Sustainable energy Technologies and Assessments Journal”. Os autores destacam que a redução de consumo de energia elétrica pode ser implementada em plantas de ureia pela utilização da energia disponível na descompressão da corrente líquida de ureia e carbamato de amônio entre a seção de síntese (alta pressão) e a seção de purificação (baixa pressão), com a consequente redução da emissão de gás de efeito estufa (dióxido de carbono/kWh) associada à geração da energia elétrica utilizada no processo de produção. A redução do consumo de energia elétrica é obtida pela utilização da chamada “turbina hidráulica de recuperação energia” ou “HPRT-Hydraulic power recovery turbine”, em inglês.
O trabalho apresenta valores de investimento e payback para diferentes capacidades de produção de ureia e preços da eletricidade. Como exemplo, para uma produção anual de 2.300 ton/dia de ureia, com um investimento estimado de R$ 5,4 milhões, preço da energia elétrica de R$ 430/MWh e taxa de desconto de 7,5%, o período de payback é estimado em quatro anos. O período de payback pode ser melhorado considerando os créditos de carbono definidos pela Curva de Custo Marginal de Abatimento (Curva MAC), devido à melhoria da eficiência energética e a redução da emissão de CO2 associada à implementação da tecnologia.
Obdulio Fanti, que tem vasta experiência na indústria de fertilizantes, explica que há vários processos industriais em que um fluido sob alta pressão deve ser despressurizado para se adequar às etapas subsequentes do processo. Normalmente, válvulas redutoras de pressão ou válvulas de controle de nível são usadas para dissipar a energia de pressão e, consequentemente, desperdiçar essa energia hidráulica. As turbinas de recuperação de energia hidráulica (HPRTs) podem converter o excesso de pressão em energia mecânica do eixo e aumentar a eficiência geral do processo. Ele destaca, no entanto, que economizar energia não é apenas um aspecto econômico é também uma importante contribuição para a proteção ambiental.
Essa tecnologia já é utilizada em unidades de amônia para recuperar energia na purificação do gás de síntese na separação de CO2 e em unidades de geração de H2, na separação de H2S e CO2, além de outras aplicações, por exemplo, em sistemas de distribuição de água.
A ureia é utilizada principalmente como fertilizante para realizar a adubação com nitrogênio, o que é fundamental na agricultura brasileira como forma de fornecer os nutrientes nitrogênio (N) Fósforo (P) e Potássio (K) e os micronutrientes necessários para obter o melhor rendimento por área plantada e contribuir para o Brasil se consolidar como potência mundial na produção de alimentos. A ureia agrícola (CO(NH2)2), um fertilizante amídico que pode ser disponibilizado perolado ou granulado, é sintetizada a partir da amônia e do gás carbônico, para obtenção de um adubo com altas concentrações de nitrogênio (46%).
Conforme a publicação, há no mundo 510 unidades de produção de ureia com uma capacidade de produção anual em torno de 195 milhões de toneladas. No Brasil, há duas unidades de produção de ureia da Unigel em operação, em Sergipe e Camaçari, com capacidades de produção, respectivamente, de 657 mil t/ano e 474,5 mil t/ano.
Fanti reforça que o artigo pode ser considerado como um exemplo de cooperação da indústria, que compartilha seu conhecimento na operação de unidades químicas, identificando oportunidades de melhorias na gestão do consumo de energéticos, com a academia, neste caso a Universidade Politécnica de Marche (UNIVPM), da Itália, e a USP, do Brasil. Essa cooperação entre as universidades da Itália e do Brasil, fortemente ligados por raízes culturais, foi destacada pela representação diplomática da Itália no Brasil.
Obdulio Fanti foi chefe de setor de Desenvolvimento Tecnológico a Ultrafértil (Petrobrás Fertilizantes), Gerente de Meio Ambiente na Refinaria La Plata de Petróleo, da YPF, e coordenador executivo da Comissão de Meio Ambiente da Abiquim, tendo elaborado o primeiro relatório, em 1999, sobre indicadores de meio ambiente da indústria química brasileira, incluindo a emissão de gases de efeito estufa, como indicador ambiental.